Marcas em tempos de polarização: coragem, riscos e autenticidade
Vivemos uma era de polarização crescente. O debate público, no Brasil e em muitos outros países, tem se dividido em campos opostos, quase irreconciliáveis. No momento em que acontece um julgamento histórico no Brasil, a polarização recrudesce e assusta. Mas essa dinâmica não fica restrita à política. Ela invade o consumo, a cultura, a comunicação e, inevitavelmente, o posicionamento das marcas. De acordo com o estudo anual Edelman Trust Barometer, que completa 25 anos em 2025, as empresas (os negócios) continuam sendo a única instituição que ultrapassa o patamar de confiança de 60%. Em outras palavras: confiamos mais nas marcas do que em governos, ONGs ou mídia. Mas essa confiança vem acompanhada de uma expectativa clara – não basta oferecer bons produtos a preços competitivos. Espera-se que as empresas tenham uma atitude propositiva, ética e responsável em relação ao mundo.
Segundo os respondentes da pesquisa da Edelman, os CEOs estão “autorizados” a agir no vácuo de governantes, na busca por um mundo melhor. Mais do que isso: espera-se uma atitude proativa das empresas. E aí surge a encruzilhada. O que significa, na prática, ter uma “atitude responsável” em um ambiente polarizado?
Tomemos como exemplo temas ligados a Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I). Para setores progressistas da sociedade, trata-se de um compromisso inegociável com justiça social. Para setores conservadores, essas ações podem soar como privilégios injustificados, um ataque à meritocracia ou até uma forma de “ideologia” indesejada. O mesmo vale para questões climáticas, direitos reprodutivos ou políticas de gênero: qualquer posicionamento corre o risco de acender fogueiras em um dos lados, atraindo detratores.
Diante disso, qual deve ser a estratégia de uma marca? Ser neutra? A neutralidade pode parecer confortável e segura, mas em muitos casos é percebida como omissão. Consumidores engajados, especialmente os mais jovens, querem ver coragem e coerência. Marcas que silenciam em momentos cruciais correm o risco de perder relevância e conexão. Por outro lado, assumir posições claras implica em aceitar riscos: ser alvo de críticas, boicotes, “cancelamentos” ou campanhas de deslegitimação.
O movimento chamado de “anti-woke” cresce nos EUA e em vários países justamente como reação ao ativismo corporativo. A solução talvez não esteja em escolher entre ativismo ou silêncio, mas em construir autenticidade. Isso significa que uma marca não deve se posicionar apenas para seguir tendências ou agradar segmentos específicos. O posicionamento precisa nascer da identidade, do propósito e da cultura da organização.
Marcas que têm coerência entre discurso e prática conseguem atravessar tempestades de opinião com menos arranhões. Quando a postura está alicerçada em valores verdadeiros, o diálogo com públicos diferentes se torna mais possível. Empresas podem até perder clientes que discordam de sua visão de mundo, mas ganham legitimidade com aqueles que buscam marcas que “fazem a coisa certa”. E legitimidade é um ativo cada vez mais valioso em tempos de desconfiança generalizada.
No fim, o desafio não é evitar o fogo cruzado, mas aprender a navegar nele sem perder a bússola ética. As empresas não têm como escapar da expectativa de contribuir para um mundo melhor. A escolha está em como fazê-lo: com coragem, consistência e clareza sobre seus limites. Num ambiente polarizado, tentar agradar a todos pode ser o caminho mais curto para não agradar a ninguém.
O posicionamento de uma marca não deve ser guiado pelo medo de desagradar, mas pela convicção de que seus valores genuínos importam, mesmo quando geram desconforto.
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